sexta-feira, 5 de dezembro de 2008

Excerto de obra recente de Gonçalo M. Tavares

Os versos fortes não têm currículo nem, dirá vossa excelência, passado. Não deixam, pois, pegadas, como as que as crianças e homens pesados deixam na areia. O verso pisa-te, sim, o coração, como se fosse o inverso de um ataque cardíaco, o simétrico bom do peso mau. Um verso forte não tem história como os países. Não tem invasões, reis assassinados, resistências, traições; e quatro adultérios de uma rainha da Idade Média. Um verso, hoje, não tem Idade Média dentro dele. Mesmo que seja um verso com dois mil anos, hoje, esse verso é absolutamente contemporâneo. Porque é verso. Um verso do senhor Homero lido hoje, dia sete, tem esta data, e currículo nenhum. Não tem Idade Média nem nenhuma outra.

(in O Senhor Breton e a entrevista)

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