segunda-feira, 16 de junho de 2014

"Que a dor seja", de Carlos Lopes Pires

Que a nossa dor subida seja
em cada coisa procurada,

na parte íntima,
no miolo e na casca,

nas árvores,
nos quartos desarrumados
e nas dispensas,

nas coisas que se dizem
de um para outro lado,
de pais para filhos,

reclinada na almofada
a tua mão no livro,

oh, as coisas que se amam devagar,
os quintais, as laranjas, os balouços,

e que a nossa dor toda seja

cumprida, inteira, ampla,
guardada em cada passo e depois,

porque a nós chega o que é chegado,
e que a nossa dor seja como a água
e seja.

(in Guarda-me contigo entre as papoilas; ed Textiverso, 2014)

Sem comentários: